Arte, porque a vida por si só não deu conta dela mesma





sábado, 27 de abril de 2013

Só Pessoa - carta ao poetador

O poeta não é assim tão fingidor, ele tem de ser um pouco dor, ter calo no pé, ser ardor, qualquer coisa que o valha. Devagar com o andor, camarada, que o poeta tem de ser volúpia santa, de tudo de ser nada, tem de ser um pouco amor e sua própria namorada. O poeta tem de ser dor, saber de cór a cor de ser triste e de ser flor também da lama brotada. O poeta tem de ser rei quando é gato vira lata. O poeta tem de ser vice, tem de ser verso que vive. O poeta tem de ser dor pra não ser ator do esplendor de cada palavra que finge ser sua e usa e abusa sobrepor à carne a alma solitária. O poeta tem de ser dor que mingua e cresce. O poeta tem de ser lua, de ser fé no sol da esquina na calçada. O poeta tem de ser dor pra brincar sério do que o tempo todo faz calor: supor viver dando pála de só letrador. Não finge tão completamente. O poeta é só um bobo, somente. O poeta é só. Não é assim tão fingidor, talvez nem tão poeta, camarada.

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