Arte, porque a vida por si só não deu conta dela mesma





segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

DOR minguo

Domingo é uma praga
Um prego no peito 
A preço de banana d'água

Estas São

[quebra-cabeça de um poema em conjunção]

Eu outono você
colhe acolhe tu
a mim ou tons
sons soam sonho
primaveram
N'outrora aqui
agora aterra!
E nós invernamos edredons
vós sois sóis
que verão!
E eles?
Os seus olhos nos meus, quem são?
Este trem vai pra qual estação?

Alessandra Gelio e Paula Uchôa


domingo, 14 de setembro de 2014

Cadê?


Goord Morning


Já levantei, liguei o som - Caetano é sempre a melhor pedida pra animar a manhã. Depois, Baleiro, mesmo que eu não tenha acordado com vontade de beijar o português da padaria - escovei os dentes, tomei um banho, li o terceiro capítulo de um clássico do Veríssimo cujo nome não me lembro agora, vesti uma roupa descolada dessas "in", na moda, cachecol colorido - está frio e me sugeriram cores - passei o perfume de fragrância amadeirada que meu ex me deu no dia dos namorados, tomei um balde de café e comi ima torrada de cottage com peito de peru. Escovei os dentes de novo e tirei o cachecol. É que tenho de me maquiar pra dar um ânimo à pele da carne que me veste os ossos. Base, corretivo abaixo dos olhos e acima das pálpebras, pó compacto pra tirar o brilho, blush cor terra, rímel. Maquiagem leve, para o dia. Coloco de volta o cachecol. Mais uma burrifada de perfume. Sempre parece que me falta a última. Calcei um all star azul pra me lembrar da Cássia. Queria roubar um cheque mas não está dentro dos meus princípios, e descobri que se quiser viver mais que ela, não devo tomar meus pileques.
Ajoelhei na cabeceira da cama e fiz uma oração de gratidão. Lembrei do meu irmão caçula, do meu pai, da minha tia parceiríssima, do meu avô que me iniciou nas letras e guardou numa pasta todos os meus poemas da sua vida, da minha melhor amiga, Cami, que subitamente fo-se aos 20 com um aneurisma e cá eu...  não borrei a maquiagem. Peguei a chave de uma casa que não é minha, conferi a bolsa: necessaire, livro, bolsa de remédios, casaco, guarda-chuva descartável, celular, carteira, ok. Chamei o elevador, entrei, desci. TCHOCK. O porteiro abriu a porta. - "Putz, o carregador do celular" - Nunca saio sem carregador de celular. Também nunca saio de uma vez só. Talvez uma coisa esteja ligada a outra. Talvez... I got it! Carregador na bolsa, desliguei o Cazuza que eu já tinha esquecido ligadasso no meu quarto, encontro com minha mãe no hall, descemos, mami foi em direção a garagem pegar seu carro para o trabalho depois de me dizer tchau. Ando pelo corredor de serviço. TCHOCK. Abro a porta do prédio. TCHOCK. A porta se fecha. Uma vizinha vem vindo com um poodle numa mão e um saco de pão na outra. Ela sorri, eu respondo "Bom dia". Coloco a bolsa no ombro.
Olho pra cima e o céu está azul, duas nuvens bem rarefeitas, sol de inverno. Caminho na calçada até a beira da rua. Enquanto espero, sinto-me perfeita para morrer.

SORRY


domingo, 7 de setembro de 2014

eu e ela somos nós






Ela não precisa de espaço nem tempo, dentro e fora, nem motivo ou causa, nem ponteiro parado, televisão sem som, som quebrado, multidão vazia, nem de gente cheia de tudo, nem de tudo nem de nada, nem de coisa alguma. Ela é coisa democrática, silenciosa, verborrágica - ela em qualquer forma. Ela na veia correndo por todo corpo, efeito instantâneo e latente. Só lhe dão se você deixar... e um espaço vazio, sem quinas, sem cor, sem gente, sem móveis. Só você e a agulha. Fina, pequena, indolor, prata, na veia, agulha, suave... Ela entra macia e faz aquele tátil pic. Só lhe dão se você deixa entrar. E você deixa. E entra, é denso e seria amargo se tivesse gosto... líquido entrando denso no corpo e o corpo olha pro teto que não há. E o teto é branco e o céu nublado e as espumas também e o azul do mar sem nuvens e o barulho chuá que vai e que vem molhado na areia gelada d'água que cobre e abandona as unhas vermelhas do esmalte risqué que começou a descascar no dedão do pé. E o gelado do coco na garganta que desce enquanto o opala 86 passa preto na rua e buzina antes de o sinal abrir. Os pés caminham sobre areia fofa antes de pisarem no chão de metal desenhado do ônibus da linha 177 que vai em direção a praça Mauá. A agulha sai num rompante do braço mas isso não é nada comparado ao lirismo daquelas montanhas cheias de curvas e árvores, montanhas com nome pão-de-açucar brilhando verdes parecendo veludo na luz que o Sol assina nesse espetáculo... altas belezas naturais logo ali atrás dos espelhos d'água, as águas vistas pela janela que anda ali no asfalto conriscos amarelos bem no aterro do Flamengo. E de repente tudo isso some! Não tão lírico era o gigantesco quase sufocante traseiro da mórbida obesa que sem licença acaba de levantar ao lado e cobrir toda a visão da cena. Ela se vai e a vista... ih! Moço! Abre aqui pra mim? O que se vê é o posto BR na Osvaldo Cruz. Escuro. Está escuro agora. Não estava quando os pés pisaram a areia fofa. Cadeira de madeira vazia sem porteiro atrás da mesa. Nossa, a parede da portaria do prédio é marfim? Não é branca? Jurava que era... E o piso? Que é isso? O piso é de mármore e de losangos e é preto e é branco e... um poste no canto direito? Um poste também de losango e também branco e também preto e alto e colonial e cafona no canto direito! Cafonérrimo! Um poste cafonérrimo no canto direito? 16 anos morando num prédio preto e branco cafonérrimo... Isso é constragedor. As plantas até que não incomodam embora não falem nem andem e pareçam mortas mesmo estando vivas. Ai que nojo!!!! Uma lagartixa branca passando com o rabo pela metade no losango. Será que o rabo da lagartixa ficou se mexendo quando ela o perdeu? De que cor será que ela vê o mundo? Será que ela vê vendo? De repente a lagartixa é cega.... Mas se é cega, pra que que tem olhos? O quê? 25º? O elevador está parado há 10 min no 25º? Ok... Ok... Tudo sob controle... É só a neurótica do 2504 fazendo obra pela 25ª vez. Aquela neurótica com a síndrome do nunca estou satisfeita com nada por isso muda o carro a cada seis meses, a cor do cabelo toda semana, a do esmalte a cada 5 minutos e o marido ela não tem porque antes de assinar os papéis ela resolve que deve mudar também. Escada. O terceiro andar não é tão longe assim, mesmo tendo o play e duas garagens antes. O problemas são essas duas garagens. Ih, a luz! Ficou acesa. Ai! Cadeira reclinável... como essa cadeira é macia. Cadeira grande marrom macia reclinável. Cadeira de preguiçoso. Frio. Merlot. Cadê as taças? Taças de vinho de vidro de cor branca de poeira de anos sem usar. Taças vazias. Taças cheias de nada dentro delas. Taças com o pano que esfrega esfrega esfrega. Transparentes as taças estavam depois do pano e antes do vinho que desce desce desce aos poucos saindo da boca verde de vidro da garrafa do Merlot que saiu da bolsa branca do supermercado coração vermelho cor de unhas descascadas. Computador ligado. Teclas brancas com letras pretas. Duas taças. Uma é minha. conversacomversoeumdedodeprosa.blogspot.com. Nova Postagem escrito em branco dentro de um quadrado laranja. "Ela" foi a primeira palavra antes que o resto das letras começassem a aparecer e... um gole. Duas taças. Uma é minha e a outra é sua. Um gole que desce desce desce e entra denso e seco e amargo desce e caminha por dentro do corpo de todo o corpo e a tela branca, tudo branco - as pareces o chão o teto, não há móveis, não há nada além. E você? No meio. Espaço vazio, sem quinas, sem cor, sem gente, sem móveis. Só você e a agulha. Fina, pequena, indolor, prata, na veia, agulha, suave... Ela entra macia e faz aquele tátil pic. Só lhe dão se você deixa entrar. E você deixa. E entra e é denso... líquido entrando denso no corpo e o corpo olha pro teto que não há. Duas taças entre mim a tela branca povoada por pretas letras que surgem escrevendo p-a-l-a-v-r-a-s dentro do pensamento. Duas taças, a minha é a vazia. Um brinde a nós duas e um gole. E eu te engulo e me embriago de você antes que pense em me engolir e eu fique bêbada pra te esquecer. Mais um brinde.


Estamos juntas e somos uma. EueelA. Só lhe dão se você deixar. E você deixa. E pede mais. Um gole. E o líquido desce vinho e amargo e seco e denso desce desce desce desce desce.
elA

terça-feira, 2 de setembro de 2014

quinta-feira, 1 de maio de 2014

TEMPO DA POESIA - encontro com um amor empoeirado

Engraçado. Acabo de achar perdido nesse espaço chamado Área de Trabalho esse texto/carta à um amor antigo. Eu cá, tentando dar ordem a algum caos que me pertença, ainda que seja a tela do meu computador, tropeço no tempo, dou de encontro com o pretérito e lembro que o que fica, quando passa, ganha além de poeira a poesia. Eu fui capaz de amar de novo toda aquela história que tinha ficado murcha e sem a beleza da flor partida, ficou brocha feito uma bexiga dessas de aniversário que se esvai desvairada pelor ares perdendo todo seu oxigênio até desmair-se patética ao chão. Pior. Ficou desmilinguida e resgada, feito balão que enche até não poder mais e estoura feito um tiro e morre ali mesmo, no susto.
Juro. Agora eu tenho certeza: amor é coisa pra se guardar do lado direito do Desktop. Eu fui capaz de amar uma lembrança cujo sentido, eu pensava, era cor vazio-pálido e desmilinguido demais pra mim. Só que eu encontrei o Tempo da Poesia e tudo virou cor  amor-empoeirado. Deixou de ser vazio-pálido e virou amor-empoeirado. Passei um tempo largo me perguntando de quem, afinal, era a autoria daquele texto, dele ou minha. As vezes ele escrevia no meu computador e, além de meu namorado, era - também - poeta. E além de também-poeta, começou a se arriscar a ser também-dramaturgo e começamos a escrever uma peça sobre o nosso "Começo", portanto ele poderia perfeitamente ter escrito algo onde eu fosse o eu lírico dele. Demorei um bocado nesta de reconhecer o defunto e tive de ir ao nosso histórico de mensagens pra me certificar de quem era o corpo. Sim, eu mesma havia escrito, mas ainda acho que esse texto é dele. Estranho isso, mas é o que senti. E foi aí que o sentido se fez: pela palavra. Sim! Pela palavra! E, de novo: sim! Foi de verdade. A gente se misturou de verdade ali. Eu li! E por não saber a quem a palavra pertencia, vi que a gente se pertenceu. Antes de se perder, a gente se pertenceu. Antes da gente tragédia, sim, a gente se poesia. E... Ou Nietzsche estava certo e "Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura" Ou eu sou mesmo louca e volta e meia vejo poesia onde não tem. Ou talvez seja a própria poesia uma doida que anda por aí feito uma epidemia contaminando uns e outros que preferem ver torto e andar descalço ainda que doa mais. Se não é doida nem doída,  acredito que a poesia seja mesmo uma cigana, uma fada, feiticeira, ou só mesmo uma aventureira, dessas que foge com o circo e aparece quando bem quer. E quando você está no espaço perdido tentando se encontrar, ela te acha. No tempo dela.

    A poesia se escondeu. Pediu um tempo pra ver se ainda sou um bom lugar de se morar. Não me perguntem, não sei onde ela está.
Lembro bem, não posso dizer que lembro “ainda”, pois não há muito ela veio cá pra essas bandas... Lembro bem dela, vindo à mim na minha janela, me acenando com oi tímido. “Te admiro de longe” ela dizia. Tinha uma fã, ora essa, ali, à minha espera.  Sim, ela estava a espera de vir me falar havia um ano já, me disse a poesia.  Não sabia ainda como vinha, mas o caso é que viera, após um bocado de espreita e de espera. A poesia veio me dizer  que me queria perto justamente pra falar o que ela mesma não sabia dizer. Pudera eu com esse convite não sentir um flerte? Era um palpite. Podia ser que a poesia não soubesse mesmo  falar coisa corriqueira, o papo, o dia-a-dia. Era isso que ela queria. Que eu fosse a palavra falada da moça Sol e da outra Lua, que inventara de colocar numa praia sob pretexto de que um fim pro mundo se anunciaria.

     E quem não abre logo de antemão a porta pra poesia? Ela toda mansa ali na janela, me falando em paixão,  em não saber, escrever súbito o amor, o eclipse, ela ali, minha visita, me olha me fita, poesia à primeira vista assim tão terna e abrupta, abri. Abri a porta e deixei-a entrar pela pele, entranhou-se logo na entrada, poesia vadia! Eu sentia e ficava lânguida, lancinante, assustada. Alucinava e não entendia porque. Era uma simples poesia. No fundo eu sabia que o medo era eu, minha avaria, o mal jeito com aquilo que admitir eu não queria, mas tinha gosto de paixão, ou parecia. Deixei estar, rimar e remar sobre mim.

    Eu e ela enroscamos nós com fé entre lencóis as nossas pernas, pés  versos e frontes, encanto nos olhos e palavras, músicas dedicadas e uma ligeira intuição fugaz de ali vivia amor e paz no peito descansado, no cafuné, café na cama, coração alado alçando vôo. A poesia virou sabiá e eu passarinha sou.


O que eu não sabia é que tardia era hora de chorar descálculo que lá atrás eu fingira que não via. Mentira. No fundo, eu previra que não adiantaria reza ou santuário:  mergulhar o lábio num aquário cheio de peixes desligados era como me jogar no mar bravo sem saber nadar e sem ter feito sequer inventário. Despreparo calculado, então? Se tem pathos não tem razão. Dioniso me tomou, mesmo abstêmia de sua bebida preferida. Tomara-me por inteiro num só gole. Eu dei mole, sei que dei. Deixo a confissão de que não domei a ousadia, dei-me a poesia e...  com ela fui feliz e fui mulher.

sexta-feira, 4 de abril de 2014

,que a vida dança na suspensão do tempo que passa calado. E se deixa estar, repousado em nossas mãos: o sonho começa quando abrimos os olhos, sem rédias. E quanto menos arredios, quanto menos grilos, pios, mais terno corre o rio e irriga a aorta... viva que plantamos calmaria nos brios, planamos sobre abismos e abrimos asas céus de comunhão. Oração do cancioneiro, derrama-o na ciranda o silêncio que pulsa de mão em mão. Que a ciranda canta cura, escuta o silêncio de coração em coração.
Nessa ciranda é o universês, que cola tua palavra na minha e roda e roda e roda e faz a roda girar. #sph
Já ouviu a cantoria da noite no céu hoje? Quando criança pensava: esse sons... será que além de brilhar as estrelas falam?
Hoje, eu sei que elas falam.
Só que o universês não foi feito pra entender, mas pra ouver, sentir e trocar, não precisa de tudo isso que usei até aqui. Tudo isso embrulha só palavra, verbo, letra empilhada. O que é, é outra coisa. E é mais. Bem mais amém.

pés descalços

Meia pa

lavra cabe

 no meu pé de poesia.


Meia pa

 ixão já não.


Meia no

 ite então
 

no meu pé roça a ousadia.

...vejo estrela!

E danço blues com ella...