Arte, porque a vida por si só não deu conta dela mesma





sexta-feira, 20 de setembro de 2013

FLORES BÁRBARAS



20.09.2013
Após saltar do ônibus sob esse céu azul de setembro, andei uns cinco ou talvez sete minutos desorientada, indo e vindo, parando e voltando, pensando em sentar na calçada suja e por ali ficar, mas decidi que nem tanto,  indo e vindo e voltando até entrar numa loja de conveniência e entornar umas doses de cappuccino sabor alpino e alguns rios de lágrimas. Maluca, louca, insana? Talvez um pouco, mas nem tanto. Poderia estar entornando vodka e cocaína narina abaixo mas eram só cappuccino e lágrimas. 

A loja que abrigava a minha liquefação era aquela que fica ali num posto de gasolina bem na  Rua da Passagem no bairro de Botafogo do Rio lindo de Janeiro. Tentei ligar pro meu namorado e ver se ele me dava um cólo, um colchão, um caldo de compreensão, mas tem hora que a coisa só nossa mora só na gente e não adianta quem diga “siga em frente”.  É que tristeza as vezes se demora num tempo só dela e precisa descansar em banho maria até escorrer e escoar os ecos que vão sumindo e virando, no momento certo, pretérito.         


É bem verdade que há quem prefira e até goste do desgosto e desmorona e esmorece e escorrega o corpo porta abaixo e vai ao chão arrastando a dor até a cama, a alma desbruçada no dilema feito drama de cinema. Não é meu caso não. Até já foi. Mas não é mais.       

O que me fez ficar assim,  liquefeita e liquidada, foi uma roleta russa que acertou bem a mira e, entre rumores de suicídio, homicídio e genocídio - generalizada barbárie – atirou contra o jardim no coração implantado.                

 O caso é que não gosto de mortes. Não conheço quem goste embora saiba de povos orientais, eslavos e indígenas que celebram com rituais festivos a passagem de seus finados para outro plano. Outro plano, aqui, ainda não é o caso.        

Quem morreu?                

Tento fazer um inventário de relíquias memoráveis moradoras de mim e o que me vem são flaches recortes de textos, gestos, risos, choros, palavras e músicas, vozes femininas, pedaços de mim e de outros cortados e colados com girassóis, rosas e espinhos num painel cujo enterro segue e a ser velado por minha sinfonia lacrimal a luz de velas e uma seleta coroa de flores bárbaras: Begônia, Margarida, Tulipa, Camélia, Rosa, flor de Lis, Crisântemos e Antúrio, Hortência.                    

Foi tanto que nem sei quão tempo empregado e impregnados de afeto, dedicação, superação e coragem há de se destacar. Não sei quanto passado e planos, quantas verdades e lembranças inventadas há nisso então. Quanta ficção, quanta cena, quanto suor, quanta troca, quanta alma, quanto corpo e torpor, quanta dor, uma cadeira de cada flor, cor, palavras de cór, Almodovar, Tim Walker, quanta substância de amor se faz desritmar sem rima alguma, sem conversa, verso, nem prosa.          

As rosas viraram sangue escorrendo dum balde de criação. Mais que resto, que renda.     

Um ano e pouco se foi desde o início e agora, no fim, nem sei com o quanto de humano se pode contar quando o encontro no  horizonte está em cheque.                 

Um ano. Um tiro. Uma morte. Roleta Russa.    
E agora ao meu luto, se me permite, retorno. Após entornar algumas doses de lágrimas e cappuccino sabor alpino da Nescafé, enxugo as lágrimas e me levanto. Prumo novo rumo. Já disse em algum lugar - perdi n’algum canto a vocação pra ser triste e ganhei o poder cristal dos chistes. Algo com aquele lance de escorpiana que lança mão da fossa, sai do poço  pro posso,  renasce das cinzas e alça vôo feito águia imensa no céu. É que (acho), sigo com fé em Deus, na vida,  e boto pé na estrada e amor na avenida. A espiritualidade me aconchega e me diz na voz  de Bethânea: "eu não ando só". E embora eu não goste da dor que sinto nas mortes, acredito na reencarnação. Estou sóbria e de pé, vivendo com arte e axé. Não dou ré, religião mas mais ainda ela, a fé. Talvez eu só não goste de mortes por dor, mas mortes com amor...Essas talvez eu ainda hei de inventar de escrever entornando sorrisos em novos papéis. 
Hoje choveu em mim, mas li por aí que amanhã serão 21 e a primavera chega aqui.  
Sim. Novas flores virão. 








Nenhum comentário:

Postar um comentário